maio 20, 2006



"pdi",

a "puta da idade" ou a ironia para a inevitável crise dos trinta quando plenos de dúvidas existenciais sobre o que parecia ficar por satisfazer, esta vestia tão bem as culpas de tudo. Até cada pequena ruga era registada e guardada num ficheiro com extensão "pdi". Sentíamo-nos protegidos por uma saudável cortina de insanidade juvenil. Com rigor dir-se-ia que nada nos atingia a não ser a impaciência própria da juventude, com aquelas dúvidas que assomam vagamente os planos traçados, e quem sabe, a noção de umas quantas semi-finais inconclusivas.
Entendo agora
* que não era nada disso. A "puta da idade" é olhar em redor e vermo-nos tal como também somos, esboços falíveis de vidas labirínticas.
Éramos tão jovens... Possuíamos portões de madeira maciça - fechados a sete chaves - e protegíamo-nos da passagem do tempo, das mortes emocionais dos incógnitos, das agonias que empurram tantos e tantos para as esquinas que habitam as sombras... Sombras que desconhecíamos.
Era demasiado fácil. E enxergamos hoje - sem fuga - que as portadas se desmoronam com inexaurível exactidão. Fomos delapidando o tempo em corredores de imaginários castelos de areia, e agora, vida e morte, apresentam-se-nos à porta e ensinam-nos que a tal "puta da idade" não é o que julgávamos. Não... não é uma brincadeira de miúdos imortais...

E eu? Que pensava? Enfrentava o meu reflexo no espelho e era só eu, sem rugas, só revolta pessoal. Era dona e senhora de uma legislação própria sobre a angústia.
E abruptamente a revolta, a angústia e o destino dos outros emergiu arquejante, numa fúria assassina e arrasou as marés domadas da minha existência, invadiu-me e defronto-os desprevenida. Com medo. Medo de encarar quem quer que se reveja no reflexo das lágrimas que não consigo estancar. Porque dói, porque o sofrimento
dos outros se tornou real. Porque não os quero a sucumbir perante mim, quero-os em concursos idiotas a ganhar felicidade a rodos.

Envelhecer seria tão simples se a passagem do tempo se fizesse apenas para nós.

E quero gritar para não colherem flores, para apenas sentirem a sua fragrância e as tingirem matizes inéditos, nessa imagem aparentemente banal sobre fruir os momentos belos que nos são dados, a meio de jornadas por encerrar.



*Poderia não explicar mas desta vez creio que o farei. Alguns de nós passamos parte da nossa vida intocados, como se "sofrimento" se lesse apenas em livros ou em filmes melodramáticos. Ou vemos os telejornais e já estamos anestesiados... Até que um dia a realidade nos bate à porta. Chamei-lhe envelhecimento, mas não é necessário que se tenha esta ou aquela idade. Pode ser agora, amanhã, anteontem... E por vezes não é um amigo ou um familiar ou um conhecido... são todos ao mesmo tempo. A vida prega-nos partidas porque lhas está a pregar a eles. Por vezes, egoisticamente, desejávamos colar os cacos e reconstruir a redoma em que nos escudáramos. Uma redoma que não suportou e estalou. Observamos o horizonte, a vida - a nossa e a deles - com os cacos nas mãos, apertamo-los até que sangremos. E sangramos lágrimas também porque há destinos que não podemos mudar e outros que não desejam ser mudados.

24 comentários:

Raquel Vasconcelos disse...

Peço desculpas pelo meu quase desaparecimento. Estou sem net e não é fácil aceder a ela fora de casa.

Gostaria que lessem um texto, dedicado por uma mulher espantosa a alguém que "teima" em não mudar o seu rumo. Quem sabe um de vós apareceu aqui no momento certo para que isso suceda...

Raquel Vasconcelos

Carla disse...

Excelente texto.
Beijos e boa semana

Miguel disse...

Devagar a idade vai chegando ...

Os cabelos brancos ...

Outras atitutes perante a vida!

Maneiras diferentes de encarar a vida!

Bjks da Matilde

PS: Peço desculpa, mas muito que não passava por cá!
Valeu a pena matar as saudades!

Andy More disse...

Aquilo por que eu passei, para chegar até aqui? Agora que me encontrei, a puta da PDI, avançou com tudo o que aprendi. Sem saber se algum dia irei ensinar o que recolhi! Gostei muito desta extensão, Raquel.

Beijos

maresia disse...

pois não sei que te diga, se adore a imagem, se chore a mensagem...

gato_escaldado disse...

A tua lucidez causa "arrepios". muitro bem escrito e... pensado! Beijos

Kalinka disse...

Raquel
Acabei de passar noutro blog em que pareceu-me que havia «telepatia entre a pessoa que escreve e eu que li o texto», aqui, digo precisamente o mesmo.
Não sei o que se passa, mas há uma unificação de pensamentos que vão dar todos ao mesmo sentido...ao mesmo assunto!!!
Este texto diz-me muito mesmo, pois sei bem o que tenho passado, com a P.D.I e foi assim que entrei nos 50, até lá era uma jovem cheia de energia, alegria, dinamismo...
Mas que mudança na minha Vida!!!
Beijokas, adorei ler-te.

Art&Tal disse...

raquelllllllllllllllll

como estás tu

vim aqui hoje por te achar muito em silencio.

dá um hello mal te seja possivel

espero que estejas bem

Helder Ribau disse...

tens ums escrita... contagiante...
Parabens

Daniel Aladiah disse...

Querida Raquel
Como sabes, os medos vencem-se, mas nunca desaparecem... a PDI junta-se à PDV e vemos o olhar triste no espelho: já? mas eu sou o mesmo(a)!... mais sabedor(a) (em princípio), mais capaz de dar valor ao que a PDV tem de bom, mas agora que não tenho o sorriso imortal e que as dores do caminho se fazem sentir, eu verifico que tenho ainda muito que aprender e que nem tudo pode estar perdido, coragem!
Um beijo
Daniel

Charlie disse...

Nunca somos os mesmos...Os nossos corpos são processos químicos contínuos em direcção à dissolução final no meio ambiente. Tudo o que somos, é o que nos rodeia. É daí que tiramos o existir e é a ele, ao meio ambiente, que nos devolvemos já sem lembranças de nós. Vivemos sim momentos. Momentos que ligamos uns aos outros por algo que se chama memória. É a memória que nos diz que não somos hoje o que éramos ontem embora pensemos ser as mesmas pessoas.
Ts ts...que erros que cometemos.
Nem os nossos corpos são os que eram, nenhuma molécula de nós resiste sem se substituir em vinte anos de vida, nem as nossas lembranças de nós mesmos são a cópia fiel da realidade passada.
Os velhos tempos são sempre bons, ninguém quer guardar de si os maus momentos. Inventamo-nos continuamente na ilusão de sermos sempre iguais a nós próprios á medida que o tempo nos consome.
Na verdade, somos só uma ilusão de nós mesmos. Nunca mais seremos o que fomos, seremos sempre a diferença entre o que seremos e o que deixámos de ser. Evoluindo pelo tempo à medida que ele nos substitui o corpo, cérebro incluido, de forma contínua e nos agarramos a algo pérfidamente volátil a que chamamos; a nossa identidade.

Light disse...

A Puta da Idade! Sem duvida
Mas as mudanças ritmicas de cada dia ajudam-nos a crescer,a envelhecer sabiamente

Carla disse...

Beijos e boa semana.

Thiago Forrest Gump disse...

Particularmente penso que destino não existe. Penso sim que somos nós que pontilhamos e criamos os caminhos.



Um abraço

Carla disse...

passei novamente por aqui e aproveito para desejar um bom fim de semana.
Beijos

Anónimo disse...

poié eu padeço de pdi... lolol

viva Portugal

Andre_Ferreira disse...

Bom! O texto está mesmo muito bem escrito. Quando se partirá a minha redoma?

GNM disse...

Querida Raquel...

Tens tudo à tua frente: Sonhos, garra, sorrisos... Tudo...

Sorrisos!

Art&Tal disse...

meninaaaaaaaaaaaaa,
como é bom sentir que andou a calcar a moinha relva.... andou no meu quintal.

raquelllll tu fazes falta aos lugares..

tu fazes falta

se nao voltas vou-te buscar pelas orelhas.

beijos

luis manuel disse...

É com naturalidade que se vai vivendo nessa anestesia, escrita em letras pequeninas, onde também se lê sentidos apelidados de egoísticos. Hum ... não me convenceu. A redoma não existe. Não há forma, de quem quer que seja se fechar em tal coisa. Embora, repetindo, essa tal anestesia tivesse alguma semelhança.
Há espaço para as lágrimas pois, para a partilha das dores, para sofrer os desgostos.
Mas certamente que a PDI não nos tirará espaço para o sorriso, para a partilha das alegrias, para a troca do conforto de carinho.

Até pode ser uma nova PDI : Para Distribuir Igualitariamente

Beijinhos

joao firmino disse...

Obrigado pela visita e pelas palavras. Não há palavras que nos constragem mais que a ausência de palavras.
Beijinhos,
João

Sentires Cruzados disse...

Dei com o teu blog. ( Não me perguntes como. Não to saberia explicar.)

Gostei do teu texto.
Calou-me bem fundo.Porque eu era uma das «intocáveis» a quem de repente, a redoma se estalou e não ficaram cacos para colar.
Um beijo sincero e um sorriso*

Carla disse...

PORTUGAL! PORTUGAL!
VIVAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA
FORÇAAAAAAAAAAAAAAAAAAA
A CAMINHO DA FINAL!

;)
Beijos

Conceição Paulino disse...

a menina escreve cada vez melhor.
Msis profundo tmb.
Hoje é a1ª csa k visito e se clahar não passarei daqui, mas fico feliz por ter vindo cá ler este teus textos. a escria salva-b nos de tantas outras mortes ara além daquelas k morremos. Não sei se é neste ou no outro k usas a palavra "destino" - não acredito nessa predeterminação.
E mais não comento pq há coisas k sã para ler e guardar os ecos k despertam.
para além de....
bjs. luz e paz ao teu redor.
P.S - já foste à minha "MONTRA"?
http://montradatmara.blogspot.com/
Hoje lá consegui (muitas horas) fazer algo de jeito sem k o "bichinho" me dissesse k os posts não tinham conteúdo....
Bjocas meina linda